terça-feira, 28 de dezembro de 2010

Um futuro de congestionamentos

Concessionárias investem em manutenção, mas não têm compromisso de expandir estradas, mesmo com explosão da frota


Foto: AE/Robson Fernandes
Rodovia dos Imigrantes. São Paulo foi o estado que mais privatizou.
Iniciado há dezesseis anos, o programa de privatização das rodovias federais brasileiras não estabeleceu com as concessionárias compromissos com metas de expansão. Alguns contratos mais recentes relacionam o fluxo de veículos à duplicação da estrada, mas não há prazos nem metas explícitas para obras, dificultando qualquer cobrança por parte do governo, segundo alerta o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). A lacuna no modelo de concessão, associada ao forte crescimento econômico e da frota de veículos, poderá fazer com que os motoristas sofram com engarrafamentos durante a próxima década.
Empresas procuradas pelo iG confirmam que a maior parte dos investimentos realizados praticamente se limitam a obras de manutenção e operação, com algumas exceções. Relatórios das maiores concessionárias do País também mostram esta tendência. As companhias possuem projetos de expansão, mas, na opinião de especialistas, não são suficientes para acompanhar a demanda. Os investimentos públicos, apesar de terem crescido após o lançamento do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e melhorarem as condições das estradas, dão conta de apenas 13% das necessidades da malha rodoviária do País, segundo o Ipea.
Na primeira etapa do programa de privatização, de 1994 a 1998, seis contratos de concessão rodoviária assinados entre governo federal e as empresas não têm compromisso algum com obras de ampliação das vias, mas sim com “a recuperação, o reforço, a monitoração, o melhoramento, a manutenção, a conservação, a operação e a exploração da rodovia”. São concessões que totalizam 1,4 mil quilômetros referentes a trechos importantes como os 400 km na BR 116 que ligam Rio a São Paulo e o trecho da Ponte Rio-Niterói.
“Aparentemente, buscou-se resolver o problema emergencial, que era ter uma rodovia em boas condições operacionais. Não se observa nestes contratos uma preocupação com o futuro, isto é, que no prazo da concessão poderia ocorrer expressivo crescimento do fluxo de veículos nas estradas, o que demandaria uma oferta maior de infraestrutura rodoviária", diz o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), em mapeamento do setor exposto em seu site. "Isto é observado nos contratos, cujos objetivos não incluem a construção, duplicação, ou mesmo a ampliação da rodovia. Assim, pode-se afirmar que a estrutura das estradas concedidas não se altera no prazo da concessão, podendo gerar gargalos", continua.
Ampliação em novos contratos
Na segunda etapa do programa de concessão, a partir de 1998, o Programa de Exploração da Rodovia substitui a palavra reforço por ampliação nos sete contratos de concessão. “Esta troca indica que o objetivo do segundo lote de concessões não é somente com a manutenção das estradas, mas também a ampliação das rodovias concedidas. Entretanto, os contratos não apresentam meta para a ampliação nem indicam o que vem a ser esta ampliação”, assinala o Ipea em um dos seus estudos sobre infraestrutura.

Na concessão do trecho de 680 quilômetros da BR-116, na Bahia, na divisa com Minas Gerais, o governo inovou no contrato, relacionando o fluxo de veículos à duplicação da rodovia, segundo o Ipea. “Os objetivos deste contrato, assinado em novembro de 2009, não diferem dos demais assinados na segunda etapa. Porém este traz uma inovação importante: relaciona o fluxo de veículos à duplicação da rodovia. Na verdade, a necessidade de duplicação de vários trechos desta concessão já existia e deveria estar sendo realizada”.
O órgão, atrelado ao Ministério do Planejamento, avalia que as concessões de rodovias foram opções à crise financeira do governo brasileiro e a preocupação era manter em bom estado de operação as rodovias existentes. “Uma solução conjuntural."
Segundo o Ipea, o período de 25 anos de concessão para uma rodovia já construída é exagerado. “Neste período a estrutura rodoviária da estrada concedida fica engessada pelo prazo do contrato de concessão, que em sua maioria não prevê investimentos de ampliação ou de duplicação”.
Mais gente e mais carga
Na esteira do crescimento de 7% da economia brasileira, crescem a frota de veículos de passageiros e a carga transportada no País. De acordo com a Associação Nacional dos Veículos Automotores (Anfavea), 3,45 milhões de veículos terão sido acrescentados ao mercado brasileiro até o fim deste ano, com crescimento estimado de 9,8% sobre os 3,14 milhões de veículos comercializados em 2009. Paralelamente, o crescimento da produção agrícola já torna o custo de transporte mais caro, segundo produtores do Centro-Oeste.
O Ipea sugere mudanças no modelo de concessão das rodovias, nos moldes do que está sendo realizado no Chile. “Há a necessidade de aperfeiçoar o modelo de concessão de rodovias adotado pelo governo federal, para atender a este previsível aumento da demanda, que pode ocorrer no prazo da concessão”.
Uma sugestão dos técnicos do Ipea é a alteração do critério de escolha do vencedor da licitação. Atualmente vence a licitação a empresa que oferece a menor tarifa de pedágio. No modelo chileno, ganha a concessão o proponente que oferta o menor valor financeiro para cumprir todas as obrigações contratuais previstas no edital, no qual se exigiria também investimento em expansão conforme o aumento da demanda.
Segundo o instituto, de 1995 a 2009 governos estaduais e federal celebraram 51 contratos de concessão, dos quais 14 na esfera federal e 37 em estradas estaduais, num total de 14.853 quilômetros de rodovias. O governo federal concedeu 4.763 km, enquanto os estados repassaram 10.090 km à iniciativa privada. Entre os estados que mais transferiram, São Paulo privatizou 4.929 km; Rio Grande do Sul, 1.729 km, e Paraná 2.544 km. Além destes, existem também concederam rodovias Rio de Janeiro, Espírito Santo, Bahia, Minas Gerais e Pernambuco.
Do total de investimentos realizados nas estradas brasileiras de 1999 a 2008, a iniciativa privada participou com R$ 9,2 bilhões ao ano, enquanto os aportes do setor público não passaram de R$ 1,9 bilhão. “Isto reflete a importância dos empresários para a ampliação
do nível de investimentos e, ao mesmo tempo, a escassez de fundos públicos para financiar as necessidades da infraestrutura nacional”, assinala o Ipea.
O Ipea observa que em outros países as concessões foram realizadas para a construção de novas estradas. “Já no Brasil, o modelo adotado não teve como objetivo construir novas autoestradas, buscava-se, simplesmente, transferir as rodovias existentes para a iniciativa privada”.

Fonte: ig ecomnomia
(Salmos 57:2) - Clamarei ao Deus altíssimo, ao Deus que por mim tudo executa.

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